sábado, 12 de dezembro de 2009

A história do 747 da Korean Airlines

Desde o final da Segunda Guerra os Estados Unidos realizavam vôos de reconhecimento próximos ou sobre a URSS, sendo que o inverso também não era nenhuma novidade. O primeiro vôo de reconhecimento por parte dos Estados Unidos contra a URSS aconteceu em 1946 quando aeronaves Boeing B-29 realizaram diversas surtidas conta a União Soviética durante a Operation Nanook. Porém este tipo de missão tornou-se mais freqüente especialmente no Pacifico após a década de 1960, quando os soviéticos começaram a dar maior importância ao Extremo Oriente. Entre 1962 e o inicio a década de 1980 o número de divisões do exército vermelho na região saltou de 18 para 47, sendo que neste período mais de 2000 aeronaves de combate foram baseadas na região. Desde o inicio os Estados Unidos observavam com atenção esta movimentação na região do Pacifico, mas após a posse do presidente Ronald Reagan em 1981, os Estados Unidos começaram aumentar ainda mais a presença militar na região, para contrapor a expansão soviética que já era vista como uma séria ameaça.Devido aos problemas enfrentados durante as negociações referentes a limitação de armas táticas em poder de ambos os países, o presidente Reagan após declarar que a União Soviética era o império do mal, iniciou em março de 1983 o programa “Guerra nas Estrelas” e aumentou ainda mais a presença militar no Oceano Pacifico. No final de março de 1983 os Estados Unidos iniciaram o Fleetex ’83, que consistia em um exercício militar envolvendo três porta-aviões e quase 40 navios norte-americanos próximos a Península de Kamchatka. O exercício foi quase que totalmente realizado a poucos minutos de vôo de Petropavlovsk, a principal base de submarino da marinha da URSS e portando dentro da área de patrulha dos submarinos soviéticos.A intenção da U.S. Navy era exatamente de provocação, mostrando aos soviéticos que eles estavam ali, muito bem armados e com capacidade de atacar em poucos minutos o território soviético.Se já não fosse bastante esta provocação com inúmeros navios próximos a águas soviéticas, no dia 4 de abril, os porta-aviões USS Enterprise e USS Midway enviaram aviões F-14A Tomcat e A-6E Intruder que sobrevoaram o arquipélago de Kurilas, já em território soviético sem qualquer problemas. Este episódio colocou a defesa aérea soviética em alerta máximo, pois aviões norte-americanos haviam sobrevoado a URSS sem terem sido importunados, o que mostrava uma falha imperdoável da defesa soviética.
Entra em cena o Cobra Ball
No dia 29 de agosto foi notada uma enorme movimentação na região de Plesetsk, que foi imediatamente associada aos testes e lançamento de um ICBM. Durante todos os testes com mísseis balísticos, os soviéticos realizavam o lançamento a partir de Plesetsk ou Tyuratam sendo que a queda da ogiva invariavelmente ocorria sobre a Península de Kamchatka.Após a confirmação de que um ICBMPL-5 encontrava-se pronto para o lançamento, por um satélite espião norte-americano a USAF enviou o seu único RC-135S disponível no momento para a região o RC-135S 61-2663. O RC-135S era um avião montado sobre a plataforma do Boeing 135 (primeira versão militar do Boeing 707), com inúmeras modificações dedicado exclusivamente as tarefas TELINT (Telemetry Intelligence) que buscava verificar o cumprimento das conversasões sobre a limitação de armas estratégicas, o SALT (Strategic Arms Limitations Talks). O RC-135S, mais conhecido como Cobra Ball I, era capaz registrar automaticamente a telemetria durante a reentrada na atmosfera de qualquer ICBM soviético e ainda realizar uma série de fotografias de todo o evento. O que permitia uma analise minuciosa de todo o teste realizado. O Cobra Ball I 61-2663 era baseado na Eislson AFB no Alaska, sob o comando do 24º Strategic Reconaissance Squadron do 6º Strategic Wing. Na noite de 30 de agosto, o Cobra Ball 61-2663 foi enviado a Shemya AFB, uma das bases aéreas dos Estados Unidos no Japão para aguardar ordens para voar próximo a Península de Kamchatka, a poucos minutos de vôo do limite da ADIZ (Air Defense Identification Zone) soviética. O objetivo era acompanhar e registrar a reentrada do míssil soviético. Na noite do dia 31 o Cobra Ball 61-2663 decolou para aguardar a reentrada do ICBM soviético. O padrão da missão naquele dia consistia em voar a uma altitude de 29.000 pés, realizando uma série de órbitas em forma de “8” um pouco além do limite da ADIZ soviética.
Korean 007 - Destino: Seul
Poucas horas antes da decolagem do 61-2663, estava sendo preparado em Nova Iorque o vôo KE 007, da Korean Airlines com destino a Seul, com escala em Anchorage no Alaska. O vôo KE 007 mais conhecido pelos passageiros como KAL 007, era um dos vôos mais rentáveis da empresa coreana, sendo que a maior parte dos passageiros eram homens de negócios e turistas norte-americanos. Um dos principais atrativos eram o valor relativamente mais baixo das passagens e o excelente serviço oferecido. O que fazia com que a maioria dos passageiros, ou todos, esquecer que a Korean era tida como uma das empresas com maior índice de acidentes e incidentes do mundo. Anos antes um 707 da empresa foi derrubado após voar sobre território soviético, felizmente o piloto conseguiu pousar com segurança em um lago congelado, mesmo com a aeronave seriamente danificada. As 23:50 do dia 31 de agosto a tripulação do 747-200B, matrícula HL-7442, que assumia o vôo KAL 007 fechava as portas do avião que contava com 240 passageiros abordo. Destes 75 eram cidadãos sul-coreanos, 23 chineses de Taiwan, 12 chineses de Hong Kong, 6 tailandeses, 28 japoneses, 61 norte-americanos, 10 canadenses e 4 australianos. Dentre os passageiros norte-americanos estava o senador Lawrence McDonald. As 00:07 do dia 01 de setembro decolava de Nova Iorque o HL-7442 para cumprir sua primeira etapa do vôo até Seul. Exatamente as 03:30 o jumbo tocava a pista do aeroporto de Anchorage para uma escala afim de trocar a tripulação, reabastecer e limpar o interior da aeronave, o tempo total estimado era de 50 minutos. Um casal de norte-americanos com seus dois filhos desembarcariam também.
Em Anchorage o KAL 007 prepara-se para entrar para a história
Enquanto os passageiros aproveitavam a escala para comer ou caminhar após o longo vôo, a nova tripulação assumia o vôo. A etapa final até Seul estaria agora sob a responsabilidade do conceituado e respeitado Cmte. Chun Byung-in, ex-piloto de caça da ROKAF - Republic of Korea Air Force, que voava na Korean Airlines desde 1972, possuindo mais de 10.000 horas de vôo, das quais mais de 3.600 eram em comando no Boeing 747. O Cmte. Byung-in possuía um currículo invejável, tendo inclusive sido escolhido em três ocasiões para ser o piloto reserva de vôos presidenciais. Ele era tido pelos colegas como alguém que buscava sempre a perfeição, sendo que sempre tentava realizar os vôos com o menor tempo possível e com a maior economia de combustível possível. Mas nesta noite parte de suas atitudes passariam a ser questionadas até os dias de hoje. O co-piloto Son Dong-Hui assim como o Cmte. Byung-in era um dos mais experientes da empresa, e também havia passado pela ROKAF, e apesar de estar apenas há quatro anos voando pela Korean Airlines, ele detinha mais de 9.000 horas de vôo, sendo que mais de 3.400 eram no 747. O engenheiro de vôo Kim Eui-Dong era um experiente profissional, com mais de 4.000 horas de vôo, sendo que mais de 2.600 eram como “Flight” de 747. Enquanto a equipe de limpeza finalizava os trabalhos na aeronave, o Cmte. Chun Byung-in se dedicava a supervisionar e analisar as tarefas que antecediam o vôo. Uma das primeiras atitudes do Cmte ao verificar que os ventos na aerovia internacional R-20 eram significativamente mais fracos que o previsto, foi atrasar o vôo em 40 minutos visando aproveitar os ventos mais fortes previstos para mais tarde. Além de realizar outras mudanças no vôo que achava serem necessárias, dentre elas a redução na quantidade de combustível que deveria ser abastecido o avião. Esta atitude foi posteriormente vista pela comissão de investigação como imprudente e arriscada. Pois haviam sérios riscos da aeronave ter de alternar em algum aeródromo no Japão por falta de combustível. Após o preenchimento do novo plano de vôo, o Cmte Chun Byung-in e os demais membros da tripulação embarcaram para certificarem que tudo estava corretamente conforme planejado. Enquanto o co-piloto Son Dong-Hui realizava o check externo, o Cmte. vistoriava o trabalho da equipe de comissários e o engenheiro de vôo Kim Eui-Dong estava na cabine preparando o vôo.
O HL-7442 estava equipado com três modernas plataformas INS - Inertial Navigation Systems, Litton LTN-72R/28, que apesar de serem o que havia de mais moderno disponível até então, dependiam que fossem programadas e alinhadas manualmente. A programação e alinhamento do sistema de navegação inercial estavam sob a responsabilidade do engenheiro de vôo, que deveria programar a três plataformas.Pela lógica sempre se começa o trabalho pelo INS 1, que é o utilizado pelo 1 piloto e que controla o piloto automático da aeronave. Para setar os dados que seriam utilizados, o engenheiro de vôo Kim Eui-Dong inseriu no primeiro INS um cassete que continha todos os 9 waypoint (Nabie, Nukks, Neeva, Ninno, Nippi, Nytim, Nokka, Noho e Inkfish) da aerovia R-20 pré-programados e demais instruções com relação ao perfil de vôo. Para que qualquer sistema INS possa realizar corretamente sua navegação, é necessário informar ao sistema as coordenadas geográficas sobre as quais a aeronave se encontra no momento. Normalmente utiliza-se a estação VOR mais próxima, pois permite uma rápida e segura verificação do sistema com relação a um ponto conhecido. Porém apesar da estação VOR Anchorage estar a pouco mais de 6 quilômetros do aeroporto seu uso não foi possível, já que naquela noite ela encontrava-se inoperante devido a trabalhos de manutenção.Fazendo com que Kim Eui-Dong opta-se por utilizar as coordenadas da cabeceira 32 que seria utilizada para decolagem.
Inicia-se a seqüência de erros
Foi então que Kim Eui-Dong cometeu seu primeiro e mais grave erro, enquanto digitava no teclado as coordenadas ele inseriu a longitude 149º59’06’’W ao invés da latitude correta 139º59’06’’W. O que representou um erro de nada menos que 555km a leste da sua verdadeira posição. Após inserir as coordenadas era necessário colocar o sistema no modo desired track / status para acionar a unidade. Infelizmente ao passar o sistema para este modo, todas as coordenadas inseridas são apagadas do display que entende que uma verificação prévia foi realizada antes. Mas não foi o que ocorreu. Ao finalizar os trabalhos no primeiro INS Kim Eui-Don passou para INS do 2 piloto, que ao inserir desta vez as coordenadas corretas fez com que o sistema acendesse uma luz âmbar avisando que havia algum erro entre as unidades. Como a luz acendeu exatamente no momento que ele terminou de colocar a latitude, é provável que ele tenha pensado que o sistema tenha dado o alerta pois ainda não havia sido imputada a longitude. É possível que antes de ignorar o sinal de alerta ele tenha conferido os dados contidos no display com o que possuía em mãos e verificando a ausência de erros tenha cancelado o aviso para poder inserir a longitude. Mas mantendo o erro no INS 1, pois ele jamais imaginaria que o sistema havia acusado o erro baseado na discrepância entre o INS 1 e 2. Ao terminar a programação do INS do co-piloto, ele programou o seu INS inserindo novamente as coordenadas corretas. Mas desta vez o sistema não poderia acusar nenhum erro, já que o aviso de erros acabara de ser desligado. Enquanto Kim Eui-Don realizava os demais checks na cabine, chegou o Cmte e o co-piloto, que iniciaram os preparativos na cabine para cumprirem mais este vôo. Com as três plataformas INS alinhadas o Cmte Chun Byung-in inseriu dois novos waypoints, que eram as estações VOR Cairn Mountain e Bethel. Que seriam utilizados para levar o jumbo até a aerovia R-20. Agora o sistema inercial contava com 12 waypoints, sendo o zero o Aeroporto de Anchorage, um Cairn Mountain, dois Bethel, e de 3 a 12 os waypoints anteriormente inseridos. A última chance de conferir com exatidão o alinhamento do INS era o waypoint 3, pois a partir dele todos os demais eram fixos imaginários distribuídos ao longo do corredor que os levaria até Seul, distantes um dos outros aproximadamente 550km. O objetivo destes waypoints é apenas servir como referencias para as devidas correções de proa da aeronave, visando manter o rumo correto.
Decolando para sua última etapa
Pontualmente as 05:00 o HL-7442 decolava de Anchorage, com tempo estimado até Seul de 8 horas e 20 minutos. As 05:02 o jumbo iniciava uma curva para interceptar o VOR Cairn Mountain, o que permitiria o Cmte. Chun Byung-in relizar a aferição do alinhamento do INS contra uma estação VOR. Por normal da Korean Airlines (e da maioria das empresas aéreas) era expressamente proibido o acoplamento do piloto automático sem a verificação do alinhamento do INS com uma estação VOR. Acredita-se que logo após a decolagem o Cmte. Chun Byung-in acoplou o piloto automático, sem a necessária confirmação do correto alinhamento do sistema. Como o KAL 007 tinha sido autorizado a voar direto até o VOR Bethel, não havia como verificar o alinhamento utilizando o VOR Cairn Mountain que era agora o último fixo realmente conhecido, já que Bethel estava a aproximadamente 15 minutos de vôo e o piloto automático estava acoplado. Visando uma maior economia de combustível o Cmte. Chun Byung-in inseriu um novo waypoint no INS, que substituiria Bethel e permitiria chegar mais rapidamente na aerovia R-20. Este novo waypoint distanciava aproximadamente 351km do waypoint Nabie que passara agora a ser o terceiro da rota e não mais o quarto.Mas devido ao erro de 10º no INS1 o novo waypoint estava a 555km a leste de Nabie. As 05:38 quando o avião passou no través do waypoint Cairn Mountain o segundo originalmente inserido, o INS1 indicou que eles se dirigiam em direção ao waypoint recém inserido enquanto os INS 2 e 3 indicavam que agora eles voavam em direção a Bethel. Os INS 2 e 3 a partir desse momento indicariam sempre um waypoint à frente do que era apresentado no INS 1. Neste momento o KAL 007 com seu erro de 10º iniciou uma suave curva para a direita, enquanto o Cobra Ball 61-2663 aguardava pacientemente a reentrada do seu alvo. Iniciando assim a contagem regressiva para o KAL 007 entrar para a história da Guerra Fria. Logo após o KAL 007 atingir 10.000 pés, o Cmte. Chun Byung-in deixou a cabine, provávelmente para cumprimentar os passageiros, procedimento muito comum na Korean Airlines. O que contribuiu para anular qualquer possibilidade de ser detectado a tempo o erro do INS 1, já que o co-piloto Son Dong-Hui estaria monitorando seu próprio INS e o avião acabara de sair do alcance dos radares do ATC Anchorage. Para complicar ainda mais, os tempos de vôo entre todos os waypoints eram praticamente idênticos, reduzindo ainda mais as chances de um dos pilotos perceber algum erro. Neste instante para Son Dong-Hui o avião saia do waypoint Nabie e voava rumo a Nukks enquanto para o INS 1 o avião estaria agora voando em direção a Nabie. Na verdade o KAL 007 não voava rumo a nenhum desses fixos e sim para um falso Nabie, já fora da aerovia R-20. Enquanto o HL-7442 voava em uma falsa aerovia, o Cobra Ball voava próximo a ADIZ soviética e era acompanhado pelos sistemas de vigilância da URSS. Porém a sorte não estava do lado da tripulação do Cobra Ball, já que por razões desconhecidas até os dias de hoje, não houve nenhum lançamento. Sendo que as 00:35 foi emitida uma ordem para regressarem a Shemya, e as 00:37 ele iniciou uma curva fechada para a esquerda se distanciando cada vez mais do alcance dos radares soviéticos. Enquanto o Cobra Ball deixava a área o KAL 007 ingressava no que a tripulação imaginava ser o waypoint Neeva e o INS 1 o waypoint Nukks, que na realidade era o limite da ADIZ soviética.
Entrando no espaço aéreo soviético
As 00:51 os radares soviéticos começaram a acompanhar dois aviões em rotas opostas, o que levou os controladores que monitoravam os aviões a imaginarem que o KAL 007 poderia ser outro RC-135S ou um KC-135, que deveria realizar o reabastecimento do Cobra Ball que já estava na área a mais de oito horas.Porém nove minutos depois um dos aviões aproou Shemya enquanto o segundo voava rapidamente em direção a Petropavlovsk, o que levou os soviéticos a terem certeza que o KAL 007 era um outro RC-135S. Enquanto o KAL 007 voava em direção a Petropavlovsk o comando da IA-PVO em Khabarovsk foi alertado sobre o intruso, que imediatamente entrou em contato com os ATC da região para verificar a existência de vôos militares ou civis naquela área. Após obter a confirmação que nenhuma aeronave militar ou civil soviética encontrava-se naquela região, foi realizada a primeira tentativa de obter contato com a aeronave intrusa, sem qualquer sucesso. As 01:12 os radares do 6981º ESG (Electronic Security Group), localizado na AFB de Elmendorf a poucos quilômetros de Anchorage, assim como os sistemas do 6920º ESG localizado em Misawa, próximo a Tóquio, detectaram um expressivo aumento nas atividades de comunicação nas redes soviéticas, que acompanhavam um avião não identificado entrando sobre a ADIZ de Kamchatka.Como nenhuma aeronave norte-americana se encontrava na área naquele momento, foi concluído por ambos ESG que o evento nada mais era que um exercício de interceptação. A 01:23 quando o KAL 007 penetrou o ADIZ de Kamchaka as unidades da IA-PVO foram acionadas para realizarem uma possível interceptação. Sendo que os primeiros seis MiG-23 decolaram de uma base aérea localizada ao norte de Petropavlovsk a 01:37. Mas devido a uma tempestade que atingiu a região dias antes e destruiu grande parte das antenas do sistema radar que ofereciam cobertura sobre o mar de Okhotsk, o controle de interceptação de Talinskaya Bukhta não foi capaz de coordenar os MiG-23, perdendo o KAL 007. Durante exatos 29 minutos o 747 voou sem ser visto pelo sistema de vigilância soviético o que causou um verdadeiro pandemônio na rede de comunicação entre as unidades da IA-POV e ZA-POV.Tanto que as 02:04, o KAL 007 abandonava o espaço aéreo da região de Kamchatka, ingressando em espaço aéreo internacional.
O destino conspira contra o KAL 007
As 02:44, o KAL 007 voltou a aparecer nos radares soviéticos, sendo captado por uma estação em Yzhno-Sakhalinks e pelos sistemas localizados da base aérea da IA-POV em Burevestnik.Neste mesmo instante, uma estação de inteligência eletrônica da NSA (National Security Agency) denominada Project CLEF, localizada em Wakkanai ao norte do Japão, captou uma mensagem urgente entre a estação radar em Burevestnik e Khabarovsk. E ainda as comunicações realizadas pelos três aviões Sukhoi Su-15TM que decolaram da base de Dolinsk-Sokol as 02:56.Enquanto os soviéticos tentavam entender e coordenar uma ação contra a aeronave invasora e os norte-americanos tentavam descobrir que aeronave seria esta, o KAL 007 entrava em contato com o controle japonês, tendo o co-piloto Son Dong-Hui informando que estava na proa de Nokka e voava 31.000 pés a 555 nós. Neste momento o 747 voltava a ingressar sobre espaço aéreo soviético, sobrevoando agora a ADIZ da Ilha de Sakhalin, sendo que as 03:00 decolava da base aérea de Smimykh um MiG-23 que também deveria acompanhar o KAL 007. Às 03:06 o Ten. Cel. Gennadi Osipovich, que voava o Su-15TM “Vermelho 17” sendo vetorado pelo GCI Yuzhno-Sakhalinsk, reportou que estava pouco atrás do intruso, mas que devido às densas camadas de nuvens não pode identificar exatamente qual era a aeronave invasora. Às 03:07 o KAL 007 realizou uma curva fechada para a direita rumo a noroeste, fazendo com que o Ten. Cel. Gennadi Osipovich indaga-se o GCI a nova proa do invasor, pois agora a aeronave voava diretamente para o continente. Teoricamente qualquer aeronave invasora realizaria uma curva para esquerda visando retornar para o espaço aéreo internacional. Para o Ten. Cel. Osipovich se existia alguma chance dessa interceptação ser um exercício esta chance não existia mais. Estava claro que ele estava exatamente atrás de um maldito RC-135S. Acredita-se que esta curva tenha sido comandada pelo INS 1 que pode ter sido re-programado através de remote-load pelo co-piloto Son Dong-Hui, que tinha como informação em seu INS que o avião dirigia-se agora rumo ao waypoint Nokka. Sendo que o novo waypoint inserido Kangnung era uma estação VOR próxima a Seul. Neste caso o INS 1 tinha a indicação de estar voando rumo ao waypoint Nytim, fazendo com que o mesmo entendesse que deveria voar até Seul através do waypoint Kangnung localizado a mais de 2.400km a sua frente. O que era considerado impossível para o sistema. Talvez percebendo que algo estava errado com o INS o co-piloto, tenha re-programado as 03:08 o INS 1 que agora entendia que estava voando em direção a Seul através do novo waypoint Kangnung. Fazendo com que o jumbo realizasse uma suave curva para a esquerda. As 03:09 o Ten. Cel. Osipovich confirmou a informação do GCI que agora o alvo encontrava-se a 80º a esquerda do “Vermelho 17”.
Alvo avistado
Às 03:13 o Ten. Cel. Osipovich se aproximou do KAL 007 na tentativa de identificar a aeronave invasora, tendo informado que tinha contato visual e radar com o intruso, sendo que um minuto depois confirmou que estava com um lock-on. Em seguida o “Vermelho 17” iniciou o processo de interrogar eletronicamente a aeronave, confirmado que não se tratava de uma aeronave soviética, o Ten. Cel. Osipovich selecionou a arma a ser utilizada caso viesse a ser solicitado. Agora o KAL 007 tinha apontado para ele um míssil R-98RM de guiagem semi-ativa com aproximadamente 45Kg de explosivo em sua ogiva. 03:15 o co-piloto Son Dong-Hui entrava em contato com o ATC Tóquio solicitando uma ascensão para o FL350, visando uma maior economia de combustível. As 03:16 o KAL 007 já cruzava o litoral leste da Ilha de Sakhalin, e dentro de aproximadamente 10 minutos já estaria novamente em espaço aéreo internacional.Como o tempo para os soviéticos estava se esgotando, foi solicitado ao “Vemelho 17” uma nova tentativa de identificar visualmente o intruso. Acredita-se que devido a escuridão o Ten. Cel. Osipovich tenha visto apenas a silhueta do jumbo e os quatro rastros de condensação que saiam de seus motores. O que poderia levar qualquer um naquela situação julgar que um 747 era realmente um RC-135S. O único fato que denunciara que aquele não poderia ser um avião militar voando alguma missão de espionagem eram as luzes de navegação acessas. Possivelmente na hora o Ten. Cel. Osipovich tenha imaginado que aquela tenha sido a forma que a tripulação do Cobra Ball tenha encontrado para tentar se manter o mais oculto possível, justamente tornando-se visível para ser confundido com avião civil. Afinal os soviéticos perderiam alguns minutos tentando confirmar se aquele era ou não um avião comercial. Minutos que poderiam ser vitais para a sobrevivência daquela aeronave.
Desperdiçando a última chance
03:20 o “Vermelho 17” foi instruído a disparar uma rajada com seus canhões com o intuído de atrair a atenção da aeronave. Pois com certeza em Moscou muitos temiam o que aconteceria caso o episódio de 20 de abril de 1978 se repetisse. Foi nesta ocasião que o 707 da Korean Airlines foi abatido por engano. E repetir esse episódio poderia trazer gravíssimas conseqüências para os envolvidos ou até mesmo para a URSS. Porém neste mesmo instante o KAL 007 foi autorizado pelo ATC Tóquio a subir para 35.000 pés, o que foi prontamente atendido. Neste instante enquanto o jumbo iniciou a subida perdendo lentamente velocidade, o Su-15TM disparou quatro rajadas, que passaram muito mais baixo do que o 747 neste momento. A perda de velocidade do KAL 007 fez com que o “Vermelho 17” quase ultrapassasse o jumbo. Profundamente irritado pela mudança de altitude da aeronave invasora, e agora mais do que nunca com a certeza de estar perseguindo um RC-135S, o Ten. Cel. Osipovich informou que a ordem para abater o avião já deveriam ter sido dada. Às 03:23 o Ten. Cel. Osipovich informou que estava quase emparelhado com o alvo, e solicitava instruções, avisando que estava reduzindo a velocidade e que neste momento o intruso estava a 70º a esquerda.No mesmo instante o co-piloto Son Dong-Hui informava ao ATC Tóquio que já se encontrava no FL350.
O vôo KE 007 chega ao final
Exatamente as 03:27 já se encontrava diretamente atrás do KAL 007 e recebia autorização para destruir o alvo. Tendo reportado em seguida que havia lançado o míssil. Segundos depois o míssil atingia o cone de cauda do 747, causando imediatamente uma despressurização explosiva na cabine principal. Menos de 10 segundos depois foi lançado um outro míssil, desta vez um R-98TM guiado por infravermelho, que atingiu o motor 2 do jumbo. As 03:27:45 o Ten. Cel. Osipovich informava ao GCI que o alvo fora destruído. Porém não foi o que aconteceu naquele instante. Com seus sistemas hidráulicos seriamente danificados, com uma severa descompressão ocorrendo, que ocasionava uma perda imediata de altitude e a perda dos motores da asa esquerda e praticamente todos os comandos desta asa a cabine do 747 tornou-se um inferno. Inúmeros avisos sonoros e luminosos dispararam, os controles se tornaram inúteis e extremamente difíceis de serem controlados e o Boeing agora iniciava uma lenta curva para a esquerda fora de controle e com uma razão de descida cada vez maior. Neste momento do co-piloto Son Dong-Hui transmitiu a última mensagem do KAL 007, informando que havia sofrido uma descompressão, com perda de controle e voava sem motores. A transcrição desta ultima mensagem jamais foi possível devido ao enorme chiado e inúmeras interferências sofridas possivelmente por uma pane elétrica. O KAL 007 continuava sua lenta queda, estando a mais de quatro minutos numa espiral descendente, que era acompanhada pelos radares de Wakkanai e pelos sistemas radar soviéticos. Ainda sem a confirmação da destruição do alvo, o GCI solicitou a dois MiG-23 que se encontravam na área para confirmarem a destruição da aeronave, às 03:38 um dos MiG informou que não tinha visual com absolutamente nada e solicitava vetoração para regressar a Smirnykh. Finalmente as 03:39 o KAL 007 mergulhava nas frias águas do Mar do Japão, encerrando assim os 12 longos minutos de agonia vivido por todos os 269 ocupantes do jumbo. Na manhã daquele primeiro dia de setembro de 1983 as diversas agências de inteligência dos Estados Unidos perceberam que a agitação ocorrida naquela madrugada não era um exercício militar. Os únicos que perceberam imediatamente que os soviéticos tinham acabado de derrubar uma aeronave foi os cinco homens que guarneciam a estação do Project CLEF, e mesmo assim apenas após o Ten. Cel. Osipovich informar que havia lançado o míssil e que o alvo fora destruído. Apesar de estar claro em todas as gravações que os soviéticos, incluindo o Ten. Cel. Osipovich tinham a mais absoluta certeza de terem derrubado um RC-135S, os Estados Unidos não iriam perder a chance de acusar a URSS de terem novamente derrubado uma aeronave civil. Com certeza esse foi um dos episódios mais marcantes da Guerra Fria e foi um dos marcos para fortalecer o discurso político de Ronald Reagan que acusava a URSS de ser o império do mal. Enquanto a URSS acusava a Korean Airlines de realizar vôos de reconhecimento para o governo norte-americano. Existem dezenas de teorias consipiratórias para explicar este evento, desde que a Korean Airlines dispunha inúmeros Boeing 747-200B dotados de equipamentos de reconhecimento, até que os pilotos conseguiram pousar o 747 em segurança, sendo que os sobreviventes se encontram até os dias de hoje presos na Russia.

Um comentário:

  1. Anos mais tarde após a queda da URSS, o piloto do Sukhoi SU-15 veio a público e declarou que sabia que se tratava de uma Aeronave Comercial. Ele apenas cumpriu ordens ao abater o KAL 007, pois a então URSS temia que se o 747 não fosse abatido poderia colocar em cheque todo o sistema de controle do Espaço Aereo Soviético como já havia acontecido uma vez com um piloto alemão que conseguiu pousar um Cessna em plena praça vermelha. A queda durou cerca de 4 minutos e como o Avião da Gol que se chocou com o Legacy, o 747 caiu em uma espiral descendente impossibilitando qualquer recuperação.

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